'avançar' através da negação


(tradução livre do artigo escrito e publicado pela fbf, aqui: Fortunate Blessings @ Japan)

O terramoto e tsunami que afectaram o Japão há pouco mais de oito meses atrás é, para a maioria das pessoas aqui em Sendai, pouco mais do que uma fagulha nas suas memórias.
Apesar de, como consequência destes desastres, cerca de 25.000 pessoas estarem listadas como mortas, e as que residem na área de Fukushima continuarem sobre a constante ameaça da contaminação da radiação, a maioria das pessoas que conhecemos nestes dias estão mais interessadas em esquecer o passado e seguir adiante do que em examinar as suas emoções reprimidas, raiva impotente e profundo desespero perante o que está a acontecer por aqui.

Enquanto participante nas formações com Elisabeth Kubler Ross, em meados da década de 1980, estive a trabalhar com um homem que foi forçado a assistir à morte da sua esposa e dos seus pais num campo de concentração alemão. A sua opressiva raiva e mágoa levaram-no a procurar ajuda numa das sessões públicas que serviam de treino prático para o trabalho pelo qual Elisabeth e a sua fundação se tornaram uma conhecida referência.
Como parte dos treinos Elisabeth sentava-se atrás dos seus formandos, discretamente orientando-os quando necessário, sempre que cada um de nós desenhava um movimento na jornada de aprendizagem do processo de facilitação e libertação de emoções distorcidas.

Depois de haver trabalhado uma considerável parte da sua profundamente enraizada angústia, este septuagenário de cabelo grisalho pareceu ter chegado a um palco onde se acomodou num espesso e assustador silêncio.
"Há aí algo mais?" perguntei-lhe, pronto para o ajudar a trabalhar através de mais uma camada. Após alguns segundos de introspecção, abanou a cabeça indicando que havia terminado o seu trabalho, informação perante a qual a sua linguagem corporal se demonstrava em nítido desacordo. Assim que me inclinei ligeiramente para a frente, da minha almofada colocada junto ao tapete onde ele se encontrava sentado, senti a mão da Elisabeth segurando o meu ombro e sussurrou-me ao meu ouvido: "Não tens o direito de retirar niguém do seu processo de negação."

Nas décadas seguintes, trabalhando com vítimas de incesto, violação, rituais satânicos, tortura, genocídio e todas as possíveis formas de perda, traição, terror, raiva, angústia e desespero, não sou capaz de identificar um ensinamento tão valioso quanto este para o trabalho com sobreviventes de desastres. Sendo capaz de reconhecer cada momento em que ser uma testemunha sagrada perante o sofrimento é, de facto, mais poderoso do que o remover o véu que as pessoas colocam como medida de sobrevivência perante memórias inimagináveis, posso acrescentar ainda mais valor a todos os que encontramos aqui em Sendai.

No Japão, neste momento, é um coração espremido em negação que encontramos tão evidente nas pessoas que conhecemos nesta visita. Como medida de optimização, a mudança do nosso foco de trabalho de ajuda para com a população em sofrimento para um mote de construção de uma melhor 'capacidade de preparação' para futuras intervenções deu-nos a possibilidade de sermos conduzimos pelas necessidades deles, ajustando os nossos workshop para uma revisão do passado de uma forma mais compreensiva, em vez de uma abordagem mais específica.
Este ajustamento resultou na criação de um bem sucedido novo alinhamento para os módulos de três horas, no qual a primeira hora se apresenta como uma didáctica abordagem de como a DSPT se desenvolve e pode ser prevenida. A segunda hora, maioritariamente experiencial e isenta de diálogos, conduz os participantes através de sequências de exercícios e movimentos que criamos para os 'playshops' com as crianças.
A última hora repete e revê os exercícios com detalhes específicos, explicando como e porque foram desenvolvidos, e como cada um se enquadra no modelo preventivo anteriormente apresentado de forma teórica.

Embora os benefícios desta nossa visita possam não ser tão evidentes como os da primeira incursão, sabemos que foi bastante significativo o impacto junto de com quem trabalhamos. Ainda de relevante importância, os resultados desta nossa experiência trouxeram-nos novas afinações neste novo esqueleto de formação para a construção de uma melhor 'capacidade de preparação'.

Num próximo artigo, o Jonah partilhará connosco mais sobre o último workshop em Tokyo.


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